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Nova redução de recursos do IPI agrava desequilíbrio fiscal dos entes públicos.

Alteração não reduz preços e ainda prejudica serviços à população mais carente

No Diário Oficial desta sexta-feira (29), o Governo Federal publicou nova legislação que reduz ainda mais recursos públicos oriundos da arrecadação do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). O Decreto nº 11.055/2022, amplia até 35% a redução na alíquota de imposto, com a mesma justificativa anterior de estimular a economia. Contudo o corte realizado em fevereiro deste ano já demonstrou o que os Estados vêm alertando: a redução do imposto não tem efetividade e causa prejuízo ao financiamento de serviços públicos estaduais e municipais.

O IPI é um imposto federal, mas cuja arrecadação atende também a necessidades fiscais de estados e municípios: 21,5% do que ele arrecada destina-se ao Fundo de Participação dos Estados (FPE), e um agregado de 25,5% ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), entre outras destinações.

Além desses fundos, 10% da arrecadação do IPI são transferidos aos Estados e ao Distrito Federal, proporcionalmente ao valor das respectivas exportações de produtos industrializados, sendo que cada Estado repassa 25% aos seus respectivos municípios. A tabela a seguir mostra o impacto fiscal dos cortes deste recurso deste ano.

A ampliação do corte do IPI em 35% poderá gerar um impacto fiscal de R$ 18,4 bilhões no total, considerando a previsão de arrecadação do imposto da Lei Orçamentária Anual (LOA) 2022. Esse total se consolidou com a soma do valor que deixou de ser arrecado entre fevereiro e abril, R$ 3,2 bilhões, com a previsão da perda com o novo decreto publicado nesta sexta-feira (29), estima-se que deixe de se arrecadar 15, 4 bilhões.

Desses 18,4 bilhões, a União arcará com R$ 7,4 bilhões e os subnacionais arcarão com R$ 10,4, sendo R$ 4,0 bilhões no Fundo de Participação dos Estados (FPE), R$ 4,7 no Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e 1,8 bilhões no Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional às exportações (IPI-Exp). Isso sem descontar o repasse de 20% para o FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação). Os Fundos Constitucionais FNE (Fundo de Financiamento do Nordeste), FNO (Fundo de Financiamento do Norte) e FCO (Fundo de Financiamento do Centro-Oeste), que financiam políticas de desenvolvimento regional, também serão impactados em R$ 0,6 bilhões.

A redução do IPI realizada em fevereiro deste ano não impactou os preços finais dos produtos e os consumidores continuaram pagando mais caro, como apontaram os indicadores de inflação anunciado pelo IBGE no dia 08 de abril. Na época, o Comsefaz se manifestou sobre a medida e publicou um levantamento demonstrando que a redução do IPI gera, aproximadamente, um impacto fiscal de R$ 19,1 bilhões no total para União e Estados, considerando a previsão de arrecadação do imposto da Lei Orçamentária Anual (LOA) 2022.

A prática brasileira já mostrou que a iniciativa aponta para dois equívocos, a redução do IPI em passado recente não mostrou resultado satisfatório para incentivar a indústria e não há aumento estrutural da arrecadação que justifique a redução de receitas. As alterações no imposto concorrem também para o desequilíbrio fiscal de estados e municípios e deve fragilizar o resultado consolidado do setor público (que inclui União, estados, municípios e algumas estatais).

Impacto nos serviços públicos e desrespeito ao pacto federativo

O Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) é um imposto de caráter extrafiscal, arrecadado pela União, com receitas partilhadas com os entes da federação, por determinação constitucional, via Fundo de Participação de Estados (FPE) e Fundo de Participação de Municípios (FPM). Os Fundos de Participação, desde a Constituição Federal de 1988 (CF88), tem um papel central nas receitas de estados e municípios, principalmente daqueles que possuem menor nível de desenvolvimento econômico.

Os decretos publicados em fevereiro e abril deste ano pelo Governo Federal impõem corte na alíquota do IPI, levando à redução impositiva das receitas dos entes subnacionais, desrespeitando o Pacto Federativo e ameaçando a sustentabilidade fiscal dos estados e municípios.

Após a crise internacional de 2008, o Governo Federal implementou uma série de subsídios fiscais com o objetivo de estimular a indústria. O IPI foi um dos impostos utilizados para incentivar a atividade industrial, principalmente na primeira metade da década de 2010, com subsídios para eletrodoméstico da linha branca, automóveis e móveis. Entretanto, a medida não alcançou os resultados previstos, como reconheceu o governo da época[1] e especialistas que avaliaram o impacto das reduções de receitas[2]. “A redução só vai facilitar a vida das empresas, que vão aumentar suas margens”, afirmou o economista José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados, entendimento acompanhado por outros especialistas que rejeitam as motivações alegadas para a medida, além de alertarem para o desequilíbrio fiscal que acarreta.

Aumento estrutural de receitas

Mesmo o Brasil apresentando déficit nas contas, o ministro da economia vem justificando ser possível cortar os tributos pois ocorre “excesso de arrecadação”. Guedes faz referência ao entendimento do Ministério da Economia de que está ocorrendo aumento estrutural de receitas, conforme Nota Informativa divulgada pelo ME[3].

O argumento utilizado pelo Ministro é inconsistente, como mostrou artigo[4] sobre política fiscal e ciclo econômico. Conforme os especialistas, não existe aumento estrutural de receitas, a nota do Ministério da Economia faz uso equivocado do conceito.

Eles explicam que a Nota Informativa utiliza indevidamente o termo “estrutural” ao se referir ao efeito da inflação na arrecadação. Também alertam que não se trata de desconsiderar o efeito da inflação no ajuste fiscal, o termo “estrutural” é utilizado pela literatura “para diferenciar as mudanças permanentes do resultado fiscal das oscilações decorrentes de fatores cíclicos, atípicos ou não-recorrentes”. Ou seja, é necessário mudanças na estrutura da economia ou na legislação.

Portanto, o crescimento real da arrecadação não é sinônimo de crescimento estrutural, como argumenta o Ministério da Economia. É necessário isolar os efeitos cíclicos e comportamentos conjunturais da economia, como é o caso, por exemplo, do comportamento da arrecadação do setor de serviços em comparação com a indústria, durante a pandemia. Trata-se de uma conjuntura específica que tende a não se consolidar ao longo tempo.[5]

Qualquer redução da arrecadação com a justificativa de que houve aumento estrutural precisa ser visto com preocupação. Os estados enfrentam grave crise fiscal desde 2014, estão longe de recuperar as receitas necessárias para prestar os serviços públicos com a qualidade que a população necessita, e já reduziram sua arrecadação em 3,4 milhões de reais desde novembro com o congelamento dos combustíveis. Mais um corte no orçamento dos entes federativos, como o proposto pelo Ministério da Economia, compromete ainda mais a prestação de serviços essenciais como educação, saúde e segurança.


[1] Cometemos “… um erro importante, o nível de desoneração de tributos das empresas brasileiras. Reduzimos a contribuição previdenciária, o IPI, além de uma quantidade significativa de impostos. Com isso, tivemos uma perda fiscal muito grande. Nossa expectativa era evitar que a crise nos atingisse de forma pronunciada.” Mas “… ao invés de investir, eles aumentaram a margem de lucro às custas de mais fragilidade nas contas públicas.” – https://valor.globo.com/eu-e/coluna/a-segunda-torre-de-dilma.ghtml

[2] ORAIR, R. O.; GOBETTI, S. W.; SIQUEIRA, F. F. (2016). Política fiscal e ciclo econômico: uma análise baseada em multiplicadores do gasto público. Prêmio Tesouro Nacional de Monografias 2016, 2o lugar.

[3] https://www.gov.br/fazenda/pt-br/centrais-de-conteudos/publicacoes/conjuntura-economica/estudos-economicos/2021/ni-elevacao-estrutural-da-arrecadacao-federal.pdf

[4] Ver: https://observatorio-politica-fiscal.ibre.fgv.br/politica-economica/outros/uma-avaliacao-estrutural-da-evolucao-recente-da-arrecadacao-partir-das

[5] A arrecadação tributária estadual em dezembro de 2021 já apresenta crescimento real negativo.

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