Em artigo publicado pelo Observatório de Política Fiscal do IBRE/FGV (Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas), os economistas Manoel Pires, Rodrigo Orair e Sérgio Gobetti apontam inconsistência na Nota Informativa divulgada pelo Ministério da Economia em setembro de 2021, que conclui que houve “aumento estrutural na arrecadação total em pelo menos R$ 190 bilhões, entre 2020 e 2021”.
A estimativa contida no comunicado do Ministério da Economia, segundo os especialistas, seria uma forma de o governo federal tentar minimizar os impactos para as contas públicas do Projeto de Lei (PL) 2337/2021, da reforma do Imposto de Renda.
Já aprovado pela Câmara dos Deputados e atualmente em discussão no Senado, o PL poderá gerar perdas que vão de R$ 41,3 bilhões a R$ 45 bilhões em receitas para os Estados, Municípios e União, segundo estudos divulgados pelo Comsefaz (Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal) e pela Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado. Dessas perdas, R$ 19,3 bilhões são apenas dos entes subnacionais.
Manoel Pires, Rodrigo Orair e Sérgio Gobetti explicam que a nota do Ministério da Economia faz uso indevido do termo “estrutural” ao se referir ao efeito da inflação na arrecadação. O assunto também foi abordado por Sérgio Gobetti no Seminário sobre a Reforma do Imposto de Renda, promovido pelo Comsefaz em 16 de dezembro.
No artigo publicado pelo IBRE, eles alertam que não se trata de desconsiderar o efeito da inflação no ajuste fiscal. “É importante observar que, na literatura de finanças públicas, não há referência consolidada que nos autorize a considerar permanente ou estrutural aumentos de arrecadação motivados por choques inflacionários, ainda mais quando tais choques também se refletem no PIB”, observam.
O termo “estrutural”, complementam, é utilizado pela literatura “para diferenciar as mudanças permanentes do resultado fiscal das oscilações decorrentes de fatores cíclicos, atípicos ou não-recorrentes”. Ou seja, é necessário mudanças na estrutura da economia ou na legislação, para gerar aumentos de arrecadação consistentes e permanentes.
Portanto, o crescimento real da arrecadação não é sinônimo de crescimento estrutural, como argumenta o Ministério da Economia. É necessário isolar os efeitos cíclicos e comportamentos conjuntarias da economia, como é o caso, por exemplo, do comportamento da arrecadação do setor de serviços em comparação com a indústria, durante a pandemia – trata-se de uma conjuntura específica que tende a não se consolidar ao longo do tempo.
Como afirmam os autores, qualquer redução da arrecadação com a justificativa de que houve aumento estrutural, como ocorreu no texto da Reforma do IR aprovado pela Câmara dos Deputados (PL 2.337, de 2021), precisa ser visto com preocupação. A última década, concluem eles, foi marcada por intensa crise econômica, e o Brasil está longe de recuperar a receita fiscal penalizada nos últimos anos.
O artigo completo pode ser lido no Observatório de Política Fiscal do IBRE/FGV.